4.12.12

Fernando Pessoa sobre Viajar


Viajar! Perder países!
Ser outro constantemente,
Por a alma não ter raízes
De viver de ver somente!
Não pertencer nem a mim!
Ir em frente, ir a seguir
A ausência de ter um fim,
E a ânsia de o conseguir!
Viajar assim é viagem.
Mas faço-o sem ter de meu
Mais que o sonho da passagem.
O resto é só terra e céu.

 Fernando Pessoa, 20-9-1933

14.9.12

Adolescentes e as maritacas. Qualquer semelhança é mera coincidência.

 Há alguns meses uma amiga me emprestou o livro "E aí? Cartas aos adolescentes e a seus pais" do Rubem Alves. No corre-corre do dia-a-dia o livro foi se ajeitando num canto da minha mesa de trabalho. Só ontem sua presença começou a me incomodar e numa sensação, como noutras vezes sentida, percebi que era o momento para iniciar a sua leitura.
Compartilho com vocês um trecho de uma das cartas, aonde ele comenta que apesar dos inúmeros estudos sobre o comportamento humano através dos bichos, nenhum bicho foi encontrado para o estudo da adolescência. O que explicaria, segundo o autor, a pobreza dos nossos conhecimentos nesta áreas. Valendo-se de uma hilária analogia, ele compara os adolescentes às mariticas. Perfeito!

http://daddydazed.com/wp-content/uploads/2011/11/teenager4.jpg

"Por muitos anos tive escrúpulos de tornar pública minha descoberta revolucionária. Lembrava-me de Darwin, que foi cruelmente perseguido e ridicularizado por haver revelado nosso parentesco com os símios. Temi sofrer retaliações caso revelasse que o enigma dos adolescentes pode ser decifrado se estudarmos o comportamento social e psicológico das maritacas...
Sim, as maritacas... Mesmo sob exame superficial, as semelhanças saltam aos olhos.
Para começar, andam sempre em bandos, maritacas e adolescentes. Uma maritaca solitária e um adolescente solitário são aberrações da natureza. Daí o horror que os adolescentes têm da casa: na casa eles estão separados do bando. Havendo cortado o cordão umbilical que os ligava aos pais, eles o substituiram por um outro cordão umbilical, o fio do telefone, pelo qual eles se mantêm permanentemente ligados uns aos outros. Eles não conseguem ficar sozinhos, porque sentem muito frio.
Depois, são todas iguais, as maritacas. E também os adolescentes. Você já viu um adolescente se vestir diferente das outras para a festa? Os tênis têm de ser da mesma marca. Os jeans, da mesma grife. A Pachá* é um templo onde os adolescentes celebram suas igualdades.
Sabiás não padecem de crise de identidade. São aves solitárias e por isso cantam bonito de fazer chorar. Quando eles cantam todo mundo se cala e escuta. As maritacas são o oposto. Gritam todas ao mesmo tempo. Deus o livre (não me livrou) de assentar-se próximo a uma mesa de adolescente, no Pizza Hut... Dizem sempre a mesma coisa, dizem sempre igual, dizem sem parar. Mas eles nem ligam. Porque ninguém escuta mesmo.
E finalmente, maritacas e adolescentes não se importam com a direção em que estão indo. Importam-se, sim, com o "agito" enquanto vão.
(...) Espero que você tenha percebido que a essência do que estou dizendo se resume nisto: em situações quando chorar é inútil, só nos resta dar risada."

Trecho de uma das cartas do livro "E aí? Cartas aos adolescentes e a seus pais". (Rubem Alves)

* Casa noturna que existiu em Campinas.

5.1.12

Memórias de Lola por Janaína Ligório


Lembram-se de Lola? Logo no início deste blog contei a sua história. Uma mulher de vida simples e guerreira que no próximo dia 14 de janeiro completa 87 anos.
Abaixo apresento o vídeo feito pela arte-educadora Janaína Ligório (minha irmã artista e talentosa!) no qual ela realiza um trabalho sensacional numa mescla de música, imagens, fotos e um dos poemas de Lola, publicado em seu livro de memórias. Adorável!






Era menino de todo jeito
Branco, mulato quase preto
Ao todo eram doze
Todos fortes e perfeitos
Nove homens e três mulheres
Era um time sem defeito


                    Meus filhos logo cresceram
                    Aí era só alegria
                    Estudavam, jogavam bola
                    E faziam estripulias
                    Confesso para vocês
                    Que eu era feliz e não sabia


                                             Meus filhos eram alegres
                                             Tocadores de violão
                                             Aos domingos íamos à missa
                                             Acompanhar a procissão
                                             À noite toda, reunião
                                             Para fazer oração

              (Laura Martins dos Reis - Memórias de Lola, 2006)

****************************